Acordamos para o nosso sétimo dia de viagem em estado de graça, a noite tinha sido ótima, dormimos em uma Pousada maravilhosa, muito bem recebidos pela amiga Ana que preparou um café da manhã regional fantástico nos servindo uma Araiá deliciosa acompanhado por cuscuz, uma energia imediata se incorporou ao nosso animo para inciar nosso dia. Fizemos um pequeno reparo no equipamento e acionamos nosso companheiro Beto para nós levar a praia, pra falar a verdade, Já havia um sentimento entre nós de saudade, mesmo antes da partida, bem que poderíamos passar alguns dias naquele lugar incrível, no entanto, uma breve lembrança de que já estávamos a uma semana longe de casa nós colocou imediatamente no trilho da realidade, partimos de Galinhos felizes a cada minuto de velejo aquele visual fantástico ia ficando para trás, logo em seguida passamos pelo bem cantado Farol que anuncia de forma majestosa a divisa entre Galinhos e Guamaré. Esse sem dúvida seria um dia especial, velejar em uma região belíssima, até então desconhecida, com muito vento contrastava com nosso sentimento de início dos trabalhos, essa parte do dia sempre foi a mais difícil, apesar de uma vigorosa sessão de alongamentos e oração era necessário muita determinação para esquecer as dores musculares e as feridas nas mãos para entrar na água, a primeira meia hora de velejo era simplesmente terrível, inevitavelmente nos pegávamos nos piores pensamentos nos questionando o que estávamos fazendo ali naquela parte do mundo. No entanto, logo eramos tomados pela responsabilidade da missão e vibração com o desafio. Fomos deixando pra trás o inusitado Farol e passamos a velejar bem afastados da praia em um parte que forma uns bancos de areia, bem distante do litoral, água bem limpa e rasa uma imensa piscina natural, paramos pra contemplar e agradecer a Deus a oportunidade de estar ali diante daquela beleza inusitada no meio do mar, logo em seguida aproamos nossas pranchas à Diego Lopes e partimos sem medo de sermos felizes, afinal o tempo é movimento e quem sabe faz a hora.
Passados já cerca de três horas de velejo ininterrupto passando por inúmeras praias totalmente desertas entre Galinhos e um ponto desconhecido apos Diego Lopes paramos afim de beber um pouco de água e discutir o andamento de nosso roteiro, sabíamos que estava apenas alguns quilômetros de Macau, sempre tive muita curiosidade em conhecer esse local, não sei porque, mas esse nome sempre despertou curiosidade, em minha imaginação achava que seria uma cidade portuária sem muitas belezas a oferecer, ledo engano, Macau se revelou uma bela localidade que vista do mar parecia mas uma cidade tipica da obra de Júlio Verne - Viagem ao centro da Terra. Como uma pequena ilha no meio da rota bem delimitada com edificações impressionantemente simétricas, toda cercada por um bem construído muro de pedras, essa pequena cidade fez viajar meus pensamentos, - o nome Macau tem origem nas araras vermelhas que habitavam a região do Vale do Açu, cujos habitantes indígenas chamavam de "Macaw". - apesar de não havermos programado uma parada ali o inusitado visual forçou um inadvertido intervalo. Pousamos nossos kites ao lado do paredão de pedras e fomos andando conhecer aquele insólito lugar, nesse momento parecia que nossa viagem havia sido inserida dentro de uma estória de livros de tempo de criança, não poderia deixar de viajar nesse mágico contesto. Tomamos um delicioso caldo de peixe servido em uma cumbuca com uma vista privilegiada do balanço natural das ondas que despejava insacavelmente sua energia no muro de pedras caprichosamente construído para proteger a cidade. Já passado do meio da tarde partimos em direção a bem querida Ponta do Mel, que bem ao fundo do horizonte já era possível se fazer vista em sua particular silhueta, apontamos nos equipamentos e partimos passando por um trecho belíssimo do litoral bem recortado por cabos e entranças de furos envolvido por uma extensa vegetação de mangue, nesse momento o mar já muito balançado nos forçou a descolar da praia e contornar uma ilha que crescia a nossa frente, desse momento em diante só pensávamos em chegar ao nosso destino final do dia, muito cansado passei a velejar em um especie de transe sem olhar pros lados, só mirando na Ponta do Mel que não chegava nunca, acho que passei um bom tempo nesse embalo até que procurei meu companheiro que a muito não via ao meu lado, nesse momento um desespero tomou conta de mim, não conseguia ver Cacá e ao e ao mesmo tempo constatei que o vento havia diminuído muito e sua direção havia mudado. Senti um desespero, me perguntei por quanto tempo havia velejado sem a presença dele, o que poderia efetivamente teria acontecido? voltei toda minha atenção ao caminho já percorrido voltando minha asa para o caminho oposto do meu desejado destino. Uma sessação incompressível de raiva começou inadvertidamente a coordenar minhas ações e sem exitar pousei meu kite na praia e comecei a andar em busca do parceiro. Apos alguns minutos encontrei o Cacá já com equipamento todo guardado, sem entender questionei - Ei blodder, não chegamos ainda, vamos voltar pro mar - Ele caprichosamente me respondeu - Impossível, não consigo mais velejar, o vento tá muito fraco, terremos que fazer o resto do percurso a´pé - Nesse momento caiu minha ficha e pude perceber que realmente o vento caíra muito, mas no meu entender ainda dava condição de chegar. Um estranho silencio pausou nosso dialogo e um sentimento de frustração tomou conta de mim, pela primeira vez estávamos com nossos objetivos desassociados, intempestivamente, na cólera do momento rede colei meu kite e injustificadamente fui me separando do amigo, quase noite o vento estava totalmente perpendicular ao relevo da praia que por sua vez tinha muitas ondas tornando a possibilidade de velejo praticamente impossível, aquela altura seria uma questão de hora conseguir chegar ao destino velejando, um sentimento de raiva tomou conta das minhas ações e talvez por um milagre conseguir começar a velejar em direção ao meu destino. Cheguei em Ponta do Mel praticamente a noite por cima das pedras absolutamente exausto, a adrenalina estava saindo por meus poros, na medida que começava a guardar meu equipamento foi se abatendo dentro de mim uma sensação de culpa justificada por abandonar meu parceiro, fiquei maluco, literalmente sai correndo afim de encontrar um local pra deixar meu equipamento e voltar atrás do Cacá, vou conversar, nunca me senti tão mau, tive vergonha de mim, fui em busca de alguém que pode-se me ajudar a encontrar o Cacá quando descobri que tinha somente R$ 40,00 de numerário, Deus ajuda nessas horas e com muito apelo consegui um motoqueiro para voltar ao fatídico local da separação. Já era noite, procuramos o Cacá por cerca de duas horas sem sucesso, meu sentimento de culpa perturbava sem descanso minha mente, quando voltando a uma pequena Pousada avistei meu herói, ali incólume, carregando seu equipamento nas costas. Uma verdadeira benção, abracei o amigo e resignadamente pedi lhe desculpas. Esse episodio sem dúvida me aproximou muito do parceiro passei a ter um respeito incontinente pela lição que havia recebido. Passado esse turbilhão de acontecimentos lembramos que o próximo grande desafio seria nos alimentar, Ponta do Mel é praticamente uma Vila de Pescadores, aquela hora, seria impossível encontrar um lugar para comer, foi quando se apresentou mais um amigo, Jefferson nos abrigou e concedeu um alimento abençoado, delicioso, sem igual : Ovo com tomates.
Pequena pausa em Macau para degustar um delicioso caldo de peixe
Ponta do Mel ao fundo
Momento do cochilo
Oitavo dia !
Apesar do perrengue do dia anterior acordamos com nossas baterias na carga máxima, a possibilidade em pernoitar já no estado do Ceará gerou uma motivação a mais, nossa trip estava chegando ao fim apesar de todos os percalços, fomos providenciar o pagamento de nossa estadia com o amigo Jerfeson, fizemos uma permuta com uma pequena compra na mercearia local que felizmente aceitava cartão de crédito, que aquela altura era nosso único meio de pagamento, em seguida, fomos à praia esperar a entrada do vento aproveitando para revisar todo material, tivemos que reconstruir minha mochila que estava prestes a se desfazer, é incrível o que ação do mar por vários dias pode fazer com o material. Estávamos na expectativa que as condições de vento melhorassem, pois já estávamos muito próximo da entrada no Ceara, suposta terra do vento, o tempo foi passando e nada do nosso combustível se apresentar, já impacientes decidimos da partida por volta de 12:0hs com um ventinho de aproximadamente 10 knós, que pra aquela região é uma merreca, velejamos por volta de duas horas nessa precária condição até chegar na Praia de Areia Branca, havia alguns velejadores por lá, ficamos um pouco e decidimos partir para nossa investida em cruzar nossa última fronteira aproveitando as boas condições de vento que há aquela altura já havia se consolidado, fizemos uma longa travessia passando bem por dentro do mar com uma grande reta até Tibau vista bem ao final do horizonte, esse percurso incrível permite uma visão bem ampla da Fox dos Rios Mossoró e Apodi, uma vista privilegiada ao fundo de Barra de Pernambuquinho, tradicional ponto de encontro de velejadores. Passamos em frente a cidade de Tibau no meio da tarde, havia uma sensação natural de alegria em cruzar a fronteira entre os estados do Rio Grande do Norte e Ceará víamos embalados por um vigoroso vento leste, pensei - se essa condição de vento segurar chegaremos em Fortaleza amanhã - não imaginava que esse otimismo logo seria substituído por uma profunda frustração, sem aviso, com o céu de brigadeiro o vento inexplicavelmente caiu vertiginosamente e pra piorar mudou de quadrante, passando a soprar do lado oposto ao nosso destino, fomos rapidamente forçados a interromper nossa tirada pousando incrédulos nossas pipas em uma Praia entre Tibau e Tremembé, estávamos atônitos em vários anos de velejo nunca havia assistido uma mudança tão rápida de vento, avistamos uma senhora a poucos metros e meu companheiro foi procurar saber que praia era aquela, quando recebeu uma informação aterradora - meu filho se estão indo pras bandas de lá ( Ceará ) pode desistir, em toda maré de lua, essa hora, o vento diminui e vira para o lado oposto, afirmou com propriedade a pescadora. O Cacá voltou com essa inacreditável informação, claro que não devemos acreditar nisso, afirmei ao amigo. Ficamos tentando sem sucesso, por mais de uma hora, seguir, até que sem mais nenhuma energia e começando a anoitecer tivemos que voltar a Tibau totalmente contristados. Uma revolta se abateu sobre nossos ombros, pra falar a verdade, pensei em jogar a toalha e interromper ali mesmo nossa jornada, não conseguia aceitar os desígnios da natureza, estávamos cansados, esgotados com o corpo já cheio de marcas, legado dos vários dias no mar, desde nossa saída estávamos administrando problemas cheio de feridas, mãos esfoladas, com todos músculos do corpo gritando, a possibilidade de chegar na terra do kite - Ceará - e não ter vento era demais pra aceitar! Resignados fomos em um silencio obsequioso procurar um local para comer e dormir, quem sabe, esperando que o próximo dia fosse melhor, se há uma qualidade fundamental encontrada em todos os exitosos, hoje posso afirmar categoricamente que é a Fé.
Intermináveis praias desertas
O por do sol mais nervoso da viagem - Ponta do Mel
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